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Opinião

Likes não bastam: Ubatuba precisa de vereadores que legislem, fiscalizem e honrem seus eleitores

Proibição de tendas nas praias foi aprovada por unanimidade, mas o silêncio sobre contratos milionários e omissões estruturais da cidade mostra que a Câmara de Ubatuba ainda está longe de cumprir o papel que a população espera — e merece.

Foto: divulgação
Foto: divulgação

Artigo de Opinião

Por Ednelson Prado


O que vimos nesta semana na Câmara Municipal de Ubatuba foi um raro espetáculo de união: a aprovação unânime da lei que proíbe tendas nas praias do município. Algo digno de nota, num plenário que se tornou notoriamente fragmentado, até mesmo quando se trata de aprovar pedidos de informação, a base do trabalho de fiscalização de qualquer vereador minimamente comprometido com o seu mandato.

A unanimidade na aprovação do projeto, que sem dúvida trata de um tema relevante — a ocupação desordenada das praias —, não pode ser comemorada como se fosse o ápice da atuação legislativa. É, na verdade, a ponta de um iceberg que esconde uma série de incoerências, omissões e silêncios estratégicos por parte de muitos parlamentares.

Vamos aos fatos: há uma legislação municipal que regulamenta o número de cadeiras e mesas que os quiosques podem ocupar na areia. Essa lei não é respeitada. Nunca foi. A fiscalização praticamente inexiste. Não se vê fiscalização em mutirões ou ações efetivas contra esses abusos. E agora se espera que a nova norma sobre tendas seja aplicada de forma plena? Se aplicada, será seletiva? Vai mirar no turista com uma tenda de R$ 99 da loja de departamento, mas fechar os olhos para os quiosques que tomam conta da faixa de areia com dezenas de mesas e guarda-sóis?

O presidente da Câmara, Gady Gonzalez, garantiu que sim, haverá fiscalização junto aos quiosques. Vamos aguardar.

A Câmara não discutiu isso. E talvez nem queira.

O que se vê é um Legislativo que parece cada vez mais dependente do Executivo. Um parlamento que deveria ser a caixa de ressonância das grandes discussões do município, mas que se especializou em aprovar moções, nomear ruas, fazer homenagens e votar projetos com alta carga midiática — como este das tendas — que geram manchetes, likes e curtidas nas redes sociais.

Enquanto isso, propostas que questionam as ações do Executivo, em forma de pedidos de informação, são abafadas ou rejeitadas; e gastos milionários não são sequer pautados.

Falo, por exemplo, dos R$ 11 milhões previstos para aluguel de banheiros contêineres — um valor absolutamente fora da realidade para uma cidade que clama por obras de infraestrutura. Ou ainda o R$ 1 milhão para serviços de impressão, quando a prefeitura já dispõe de um sistema de digitalização pronto, esperando apenas vontade política para entrar em funcionamento.

Sem contar a previsão, já ventilada nos bastidores, de um pregão que pode chegar a R$ 40 milhões para estrutura de eventos — tenda, som, palco, iluminação e shows. Isso em uma cidade onde faltam medicamentos, filas se arrastam na saúde, e pontes, orlas e obras estruturantes seguem inacabadas.

E a Câmara? Silencia.

Faz-se necessário lembrar que a legislatura passada — a pior em décadas — deveria servir de exemplo de como não fazer política pública. Ela foi marcada por um grupo dos vereadores que passou quatro anos cumprindo o papel de figurantes, agindo como avalistas silenciosos de um Executivo que, à época, também falhou em áreas essenciais. Não podemos repetir esse erro. Ubatuba não suporta mais quatro anos de conivência legislativa, silêncio, omissão e olhos vendados.

A nova legislatura tem a obrigação moral e institucional de fazer diferente. Mas até aqui, o que se vê é mais do mesmo, com uma ou outra exceção individual. Quando até vereador de partido de oposição se curva e ajuda a barrar pedidos de informação, o que temos não é oposição — é conivência com a omissão.

A função do vereador é clara na Constituição e na consciência popular: legislar, fiscalizar e representar o povo. E isso não se faz com foto ao lado de barraca apreendida ou com texto no Instagram dizendo que "estão de olho". Isso se faz com ação efetiva, com coragem de enfrentar licitações suspeitas, de interpelar secretários omissos, de convocar audiências públicas, de denunciar desmandos, de aprovar leis com fiscalização real e abrangente.

O Legislativo não é um puxadinho da Prefeitura. Não é extensão do gabinete do prefeito. É um poder independente. Que se comporte como tal.

Que a lei das tendas não se torne só mais um texto bonito, desses que viram adesivo de fiscalização seletiva. Que ela seja aplicada com isonomia — inclusive contra os grandes, os influentes, os "intocáveis" do setor turístico. E que essa onda de aprovação unânime sirva de inspiração para o real enfrentamento dos temas que a população quer ver na pauta: saúde, transporte, educação, segurança, infraestrutura e, claro, respeito com o dinheiro público.

Porque a política do espetáculo pode até gerar manchete hoje, mas é na ausência de fiscalização, no silêncio dos gabinetes e na omissão dos votos que se constrói o verdadeiro fracasso político de um mandato.

E Ubatuba, que tem mais de 100 praias e ainda mais urgências, não pode continuar sendo tratada como cenário de propaganda política.

Ednelson Prado

Jornalista e Doutor em Comunicação


** A Opinião de nossos colunistas não representa, necessariamente, a opinião do LN21. 

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